Um Avô Muito À Frente

September 5, 2021, 4:20 am

Ali, naquele momento, conseguiu reinverter o que eu achava já impossível. Costumo dizer que o maior ponto de viragem na nossa vida é quando nos passamos a preocupar mais com os nossos pais e avós do que eles connosco. Ali, ele estava preocupado comigo, preocupado com a minha preocupação, tentando garantir que eu também conseguia aproveitar o jogo. O Sporting ganhou. Esteve a perder mas deu a volta. Nos dois golos, olhei para ele e pareceu-me ligeiramente desconfortável. «Conseguiste ver quem marcou? », perguntei-lhe. «Não», respondeu-me. Sabia que tinha sido o Sporting, claro, mas a visão e a rapidez do jogo, e do próprio lance, não lhe deu grande margem. Estava feliz, obviamente, mas de certeza que havia muito mais a passar-lhe pela mente do que deixava transparecer. Quando saímos, o caminho para o carro foi ainda mais complicado: desta vez era a subir. Por mais que se tentasse fazer de forte, não resistiu a pedir para pararmos. «Rui, o avô está um pouco cansado», disse-me, antes de finalmente ceder à minha insistência de ficar ali e deixar-me ir buscar o carro.

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O olhar e o sorriso de alegria valeram mais do que três pontos, uma vitória ou um título. Ter o poder de deixar alguém feliz desta forma vale mais do que tudo o resto. Uma aventura complicada O jogo foi em 2010. Dez anos antes, o meu avô levava-me quatro vezes por semana ao campo do Estoril para os treinos. Ali, agora, era ao contrário. Desta vez, ao contrário do Sporting-Rio Ave, fomos só os dois. Não ia ser fácil, mas era uma experiência que íamos partilhar juntos, muito possivelmente uma última vez. Estacionar por aqueles lados é difícil e ofereci-me para o deixar junto ao estádio e ir estacionar. Não quis. Quis ir comigo. Fiz o possível para arranjar um lugar o mais próximo possível e iniciámos a caminhada, cheia de metas volantes e paragens para "reabastecimento", como quando víamos o Orlando Rodrigues representar Portugal na Volta a França. Entrámos no estádio, descobrimos os nossos lugares e ele tinha um misto de olhar de criança e de cansaço acumulado. A primeira verdadeira frase completa que me disse foi: «Não te preocupes com o avô que o avô está bem».

Eu desabei e dessa vez eu não tive nem forças pra fingir que estava tudo bem. Uma sequência de notícias ruins tomaram conta. Por outro lado eu vi minha família se unir ainda mais nesse momento. Se eu já era próxima de todos, me tornei mais ainda. Cuidei e fui cuidada. E lá de cima ele também cuidou de tudo. Cada detalhe parecia milimetricamente pensado. Quando meu coração começava a apertar de desespero, surgiam trabalhos que eu nem estava esperando. Aprendi tanto, mas tanto, que 8 meses mais pareceram 8 anos. E mais uma vez eu não deixei a peteca cair. Fui tentando tirar boas lições de cada coisa que acontecia. E quando eu coloquei o lance da "gratidão" realmente na frente, tudo começou a dar certo. Além de toda essa superação pessoal, outra coisa que se tornou ainda mais forte em mim foi essa luta que nós mulheres encaramos todos os dias. Hoje posso dizer com plena convicção que sou feminista sim e não me venha com preconceitos. Eu sofri a cada notícia de mulher violentada, abusada e morta por homens.

O sonho do novo Alvalade Quando o novo estádio foi construído, houve um sonho que foi sendo alimentado: poder passar um dia em Alvalade, começando com almoço e acabando com um jogo do Sporting. Problema? O mesmo do cântico das claques leoninas: querem ir à bola ao domingo à tarde mas não podem. Com uma situação de saúde cada vez mais delicada, em que o frio à noite seria sempre um problema, foi preciso esperar por um Sporting-Rio Ave da Taça de Portugal, a 21 de janeiro de 2007. Tinha 81 anos. Ver Alvalade foi importante mas a experiência não foi a esperada, muito por culpa de uma sequência de atrasos e confusão na compra de bilhetes que pareceram apressar a tarde e torná-la em pouco mais do que um "ir e vir". A partir daí, a frase do sonho sofreu uma pequena alteração: «Gostava de ir outra vez, mas desta vez para almoçarmos mesmo lá e tudo». E foi assim continuamente até perceber que dificilmente poderia embarcar na mesma experiência outra vez. O princípio do afastamento No início da época 2010/11, o cardiologista deu-lhe uma notícia que foi como um soco no estômago.

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